sábado, janeiro 03, 2009

6. 

Aline quase não reconheceu a Aldeia. Mas talvez a mudança mais em si estivesse e menos nos terraplenos do largo, no anúncio luminoso e nos cartazes de papel brilhante do café, nos hambúrgueres e nos bitoques, no parque de máquinas, nos estradões rasgados pelo meio dos campos lavrados do nascente. O ondulado dos montes, das linhas de cumeada sucedendo-se na distância, devolviam-lhe aos poucos o tempo antigo e aproximavam os lugares e a memória que ficara deles. E então, na curva do caminho que levava à Colina das Pedras Amarelas, ficou por instantes a olhar a Ponte de Arame e o rio subindo e quase tocando as suas tábuas velhas e os cabos metálicos que a suspendiam de um ao outro lado do vale. Aline e Manuela olhavam em redor; e, de súbito, a Casa desenhou-se no seu perfil inconfundível. As águas da albufeira, represadas por uma barragem de cimento erguida a mais de cem metros de altura, subiam vagarosamente as curvas de nível, avançavam pelos degraus da entrada, cobriam já os muros que ligavam o pátio e a adega da Mina. O silêncio parecia reverter dos lençóis subterrâneos. E Aline, também ela em silêncio, olhava esse mundo antigo que desaparecia para sempre no fundo das águas.